ESPAÇOS
Quando atravessamos os portões para conhecer a aconchegante Roça Itaussu logo nos deparamos com o verde das Matas de Oşóssi e a beleza das águas de Òşún. O cheiro da terra molhada e a alegria dos animais que habitam o lugar. O galinheiro repleto de aves se banhando sem parar. Borboletas azuis (extintas em outros lugares) logo dão as caras exibindo toda sua pureza e os micos se apresentam em família, interagindo com os humanos como se fossem de casa. De repente a gente sente uma energia diferente. É possível despertar a fé através do silêncio na presença do sagrado que existe em cada canto desse lugar.
A caminhada já começa com as bênçãos de Eşú e Ogum, que estão finamente representados em seus respectivos assentamentos coletivos. Também há o grande guardião das folhas, Ossanyn mostrando toda sua importância através de seu extenso jardim repleto de ervas sagradas. Tem como companhia nada menos que Oşumaré, Obalwayé e Tempo formando o panteão africano localizado no coração da Grande São Paulo. Quem disse que nossa badalada metrópoles cosmopolita não desfruta de um dos maiores Terreiros de Candomblé, é porque ainda não conhece a nossa querida Roça Itaussu. Um lugar especial, repleto de amor que Orun (Céu) nos reservou em Ayê (Terra).
Com a prática da fé nos orixás vêm a necessidade do culto à ancestralidade.
Quem nunca pediu a Iemanjá um novo amor? A Eşú proteção, à Ogum bons caminhos ou fertilidade à Oxum? Quem nunca se sentiu ofendido e pediu justiça a Şangò?! Quem nunca rogou a Obalwayé para vencer a doença? Quem não lembra de Oyà nos momentos da tempestade? Quem não precisa da paz de Oxalá ou da fartura de Oşóssi todos os dias?
Só se não for brasileiro! No Brasil a gente já nasce padecendo. Precisa de toda ajuda possível.
O culto à ancestralidade é realizado desde os primórdios. Foi mantido em grande parte das civilizações e é realizado em todos os continentes. Especialmente no Brasil, pela chegada do número expressivo de nativos africanos, através desse legado fomos agraciados com o conhecimento do culto aos Orixás. Deuses da mitologia africana que trazem em seus arquétipos todas as qualidades essenciais para o bom desenvolvimento da humanidade.
Estamos aprendendo todos os dias a nos inclinar para os Orişás no intuito de vencer para a vida!
O que é nascer para o Orişá? A iniciação para a religião. Ou, podemos dizer, para o sagrado.
Quando somos informados através do jogo de búzios que devemos nascer para o orixá, significa que devemos seguir essa orientação e que é chegada a hora de escolher um lar para assentar tal divindade. O Orişá tem dois receptáculos, o principal é o iniciado e o segundo é o seu igbá orixá. Ambos passam por todo um ritual de sacralização para que estejam purificados e aptos para adentrar para uma família espiritual na Terra, o egbé. Somos convidados a conviver com novas pessoas, nossos mais velhos e logo mais, com nossos mais novos (aqueles que são iniciados depois de você), no candomblé nós contamos a idade através do nascimento espiritual, ou seja, após a iniciação. Então será muito comum pessoas mais jovens com mais tempo de santo, e que merecem esse privilégio, pois só quem é do Aşé sabe como cada etapa é valiosa.
Após o chamado do Orişá é muito importante encontrar uma casa (Ilê) com condições de nos assessorar em todo o processo iniciatório. Não basta ter o sagrado assentado, tem que ter um posicionamento sólido (origem), tem que transmitir conhecimento, tem que ter aşé.
Quando procuramos um Ilê, significa que estamos em busca de acolhimento, que precisamos de cuidado, significa que somos imperfeitos e que o orixá se coloca à disposição para fazer das nossas vidas, mais feliz. É um compromisso eterno que deve ser selado através de rituais fundamentais para que todas as energias coabitem em harmonia. Quer dizer que eu posso ser de Oşun e Oyà com total equilíbrio. Que um filho de Oxalá também pode ter o aşé de Eşú e ainda sim, ser muito feliz. Desvendar esses segredos e trazer esse magnetismo significa que existe uma grande alquimia por trás de cada ato. E que só um sacerdote bem preparado é capaz de lidar com tais peculiaridades.